Brasil e Argentina, parceiros e concorrentes

Amélio Dall’Agnol, pesquisador da Embrapa Soja e  Pedro Moreira da Silva Filho, pesquisador aposentado A Argentina não é apenas o maior adversário do futebol brasileiro, também é importante parceiro comercial do Brasil; o 3º maior depois da China e dos Estados Unidos. Por outro lado, o Brasil se constitui no principal parceiro comercial da Argentina,…

A Argentina não é apenas o maior adversário do futebol brasileiro, também é importante parceiro comercial do Brasil; o 3º maior depois da China e dos Estados Unidos. Por outro lado, o Brasil se constitui no principal parceiro comercial da Argentina, e o que é mais importante, os produtos que a Argentina importa do Brasil são, principalmente, produtos manufaturados ou semimanufaturados, diferente de outros parceiros comerciais como China, Europa e Estados Unidos, cujas aquisições no Brasil se concentram em commodities agrícolas e minerais, com pouco valor agregado.

Se bem a Argentina importa muito do Brasil, também é forte concorrente no comércio internacional de produtos agrícolas, em cujo âmbito se inserem, também, suas principais exportações para o Brasil: trigo, vinhos, azeite, frutas e carnes finas, entre outros, mas também máquinas e automóveis.

Argentina não é um país pequeno. Dentre os de língua espanhola é o de maior tamanho (2.780.000 km²): 6,83 vezes o tamanho do Paraguai (407.000 km²) e 15,8 vezes o território do Uruguai (176.200 km²), embora seja apenas o quarto em população (44,27 milhões) depois do México, Colômbia e Espanha. No final do século XIX / início do século XX, a Argentina foi uma potência econômica e social global, sendo Buenos Aires – sua capital – considerada a Paris da América. Nesse período, as exportações de trigo passaram de 100 mil para 2,5 milhões de toneladas e as de carnes, de 25 mil para 365 mil toneladas. O principal destino eram as nações europeias, cujos jovens, a principal força potencial do campo, estavam permanentemente envolvidos em conflitos bélicos e, portanto, impossibilitados de produzir o próprio alimento. A Argentina aproveitou-se do momento favorável e cresceu.

Em 1908, a Argentina ostentava a sétima maior economia do planeta, com a renda per capita 400% superior à do Brasil. De 1870 a 1914, o PIB da Argentina cresceu a uma taxa média anual de 5%. Um fenômeno. Mas a fartura acabou em meados do século XX, com o estabelecimento no país do populismo peronista e o término da 2ª Grande Guerra, com a qual a Argentina não se envolveu formalmente, mas usufruiu das benesses com exportações abundantes e bem pagas.

A festa acabou, mas a economia argentina continua crescendo, embora mais lentamente do que seu potencial em recursos naturais permitiria. O país ostenta o 22º PIB global (US$ 771 bilhões em 2017) ante o Brasil que ocupa a 8ª posição, com US$ 1,7 trilhões. A Argentina integra o grupo do G20 e está convidada a integrar, também, o grupo da OCDE, façanha que o Brasil buscou, mas não conseguiu. A renda per capita do argentino é bastante superior à do brasileiro (US$ 14.402 vs. US$ 9.821/ano, respectivamente, em 2017); a expectativa de vida é maior, a taxa de mortalidade infantil menor e o percentual de pobres na população é mais reduzida: 0,4% para Argentina e 4,8% para Brasil (BID, 2018).

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), de saúde e de educação são superiores aos brasileiros. O IDH, calculado pela ONU a partir de um conjunto de indicadores socioeconômicos, mostra a Argentina à frente com 0,825 ante 0,759 do Brasil (2018). Na educação, a Argentina acertou priorizando o ensino básico, enquanto o Brasil fez a opção de investir no ensino superior; o que parece ter sido um erro.

A população da Argentina é altamente alfabetizada (97% contra 84% do Brasil), o que deve ter contribuído para a conquista de cinco Prêmios Nobel, dois deles Nobel da Paz. O Brasil ainda busca o seu primeiro.

Assim como o Brasil, a Argentina é forte no agronegócio, exportando grandes quantidades de soja, milho, trigo, carnes, vinhos e couros, entre outros produtos. É um país privilegiado pelos solos férteis e planos, localizados próximos a grandes cursos d’água navegáveis, permitindo que sua produção escoe mais por hidrovias do que por ferrovias ou rodovias.

Juntos, os dois países respondem por parcela significativa do mercado mundial de soja, de carnes e de cereais. Assim, considerando o cenário geopolítico atual, é mais racional cooperar do que se indispor com os argentinos, unindo forças na disputa pelos mercados globais de produtos agropecuários.