O óleo essencial e o extrato vegetal de uma planta que vive no Cerrado de Minas Gerais podem ser usados na fabricação de enxaguatório bucal para combater a ocorrência de cáries dentárias. A chamada arnica-mineira, rústico arbusto que ocorre em meio às pedras, é bastante usada pela população para tratar hematomas e contusões.
A partir de pesquisa conduzida na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) em parceria com a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, por meio do Instituto Agronômico (IAC), essa espécie da biodiversidade brasileira deu origem a uma patente de inovação que pode proporcionar às indústrias de higiene bucal um meio de utilizar o óleo essencial ou o extrato da arnica contra um dos microorganismos causadores da cárie dentária, o Streptococcus mutans, e sobre o biofilme formado por essa espécie.
A pesquisadora do IAC, Marcia Ortiz Mayo Marques, estuda a arnica-mineira há 14 anos com o objetivo de conhecer sua genética e sua composição química, além de entender como cultivá-la e fazer testes biológicos. “Buscamos conhecê-la sob o ponto de vista químico e suas aplicações agrícola, farmacêutica e cosmética”, diz. A expectativa é compreender como cultivar a planta, que está em risco de extinção.
A patente inovação é da nanoemulsão de arnica, resultante de pesquisa conduzida em doutorado desenvolvido na UNICAMP, por Vanessa Salvadego de Queiroz, sob orientação da professora Angélica Zaninelli Schreiber e co-orientação da pesquisadora Marcia Ortiz Mayo Marques, do IAC. A pesquisa foi realizada de 2010 a 2012. A nova patente foi concedida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), por meio da Agência de Inovação Inova Unicamp. As três pesquisadoras foram homenageadas no Prêmio Inventores 2019, na categoria Patente Concedida, em junho passado.
Especialista na área de fitoquímica, Marcia relata que as substâncias de plantas não são solúveis em água. “Essa forma desenvolvida na patente solubiliza o óleo essencial e o extrato vegetal, que então podem ser usados em produtos”, explica.
Segundo a pesquisadora do IAC, a nanoemulsão de arnica constitui o veículo que permitirá às indústrias utilizarem os princípios ativos da arnica na elaboração de enxaguatórios, a partir do licenciamento da patente.
Vanessa testou o óleo essencial e extratos da arnica-mineira contra um dos microorganismos que originam a cárie e, a partir desses experimentos, desenvolveu uma nanoemulsão que combate esse problema de saúde bucal.
“Nosso trabalho tem essa ação com começo, quando estudamos o que planta tem, com meio, quando investigamos para que servem seus compostos, e com fim, onde identificamos como cultivá-la a fim de viabilizar o abastecimento do produto final à indústria”, explica a pesquisadora do IAC, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA).
Os estudos no IAC mostraram que a arnica-mineira tem grande diversidade genética e ocorre do Sul ao Norte de Minas de Gerais. “Isso significa que, quimicamente, ela tem substâncias diferentes, que podem ter aplicações diversas”, completa. A pesquisadora ressalta que essa riqueza da biodiversidade brasileira precisa ser conservada. Para isso, são necessárias políticas públicas voltadas à manutenção dos ambientes onde essas espécies ocorrem. “É preciso manter esses espaços intactos ou a arnica entrará em extinção”, alerta.
A pesquisadora explica que há plantas nos biomas do Brasil que precisam de ambientes específicos. “É típico da flora nacional as plantas se propagarem em lugares exclusivos, com clima e solos diferenciados, como ocorre no Cerrado mineiro”. O Cerrado, diz a pesquisadora, também tem a característica de sofrer incêndios frequentes, o que reforça o risco para as espécies não cultivadas. Daí a relevância de a ciência conseguir domesticar a planta e obter meios de cultivá-la.