Depois de um leilão em que biodiesel atinge valores mais altos é comum vermos notícias falando a respeito o impacto disso sobre o preço do diesel nas bombas. Foi exatamente o que a Folha de S. Paulo fez ontem. O potencial aumento do preço do diesel nos meses de setembro e outubro próximo é um fato; o problema de passar essa informação sem o devido contexto é levar a população em geral a pensar que o biodiesel é o vilão do preço alto. Na verdade, é o contrário que tem acontecido.
Se mapearmos os preços do biodiesel e do óleo diesel, é possível verificar que o preço do primeiro está mais baixo em alguns estados brasileiros. Até o 4º bimestre, o mesmo acontecia em praticamente todos os estados do Brasil, com exceção dos estados do Nordeste. Mas esses dados acabam caindo no mesmo erro de mostrar o momento sem olhar para o quadro de forma mais ampla.
Para resolver essa questão, é preciso olhar o comportamento dos preços do biodiesel e do diesel durante um período mais longo. A ANP e a Petrobras apresentam o preço do diesel S10 e S500 de forma separada. A data de início da comparação escolhida foi janeiro de 2013, quando o Diesel S10 começou a ser vendido no país.
Nessa comparação consideramos o crescimento percentual do preço dos combustíveis e do dólar, tendo como base o valor de janeiro de 2013. O resultado está no gráfico abaixo.
O preço do biodiesel vem se mantendo em relativa estabilidade por quase 7 anos. Nesse comparativo, o valor mais alto do biodiesel aconteceu entre novembro de 2016 e fevereiro de 2017, quando o preço do biodiesel ficou 12,1% acima do que apresentava em janeiro de 2013. No Leilão 68, o preço médio do biodiesel ficou 11,5% mais alto que o valor de referência. Essa constância nos preços do biodiesel é um feito importante da indústria e muito pouco exaltado.
Nesse mesmo período, o dólar subiu 96,9%, o diesel S500 68,5% e o S10 62,6%. Esses números mostram que se o biodiesel não fosse misturado ao diesel, o aumento nos preços para o consumidor final seria ainda maior.
Abaixo da inflação
Comparando essa evolução com o IPCA, vemos que só o biodiesel ficou abaixo da inflação acumulada no período.
Entre janeiro de 2013 e julho de 2019, o IPCA registrou 44%, enquanto o biodiesel vai estar, no 5º bimestre de 2019, 11,5% mais caro que estava em janeiro de 2013. Contudo, se considerarmos o preço médio do biodiesel em 2019, o valor está 1,8% menor.
A manutenção do preço do biodiesel é algo ainda mais notável se levado em consideração que o dólar subiu mais de 96% e os insumos usados pela indústria são cotados em dólar. O metanol, o metilato de sódio e óleo de soja têm preços de referência em dólar. Ainda assim, o litro do biodiesel que custava US$ 1,34 dólares no começo de 2013 agora pode ser comprado por US$ 0,76.
Esses números mostram que não é possível julgar a indústria com base num único instantâneo. Aumentos da mistura e os impactos da entressafra da soja tendem a empurrar o preço do biodiesel para cima. A história, no entanto, tem mostrado que esses aumentos são compensados nos meses seguintes por reduções de preços.
Só que essas reduções não costumam ganhar o mesmo destaque nas manchetes.
Por: Miguel Angelo Vedana